Esta quinta-feira (5) marcou o adeus definitivo a uma das maiores arqueólogas e pesquisadoras da história do Brasil e do mundo. Niède Guidon, que faleceu na madrugada desta quarta-feira (4),será sepultada no jardim de sua própria casa, assim como desejou em vida. A informação foi confirmada ao O Dia pelo secretário de Cultura de Coronel José Dias, Arivan Lima. A residência de Guidon fica próxima à sede do Museu do Homem Americano, em São Raimundo Nonato, no Sul do Piauí.
A cerimônia será restrita aos familiares próximos e também aos funcionários do Parque Nacional Serra da Capivara

O sepultamento da franco-brasileira que mudou a forma como o mundo entendia o povoamento do continente americano será em um dia cheio de simbolismos. O dia 5 de junho marca também os 46 anos de fundação do Parque Nacional Serra da Capivara, criado em 5 de junho de 1979. Na data, também é celebrado o Dia Mundial do Meio Ambiente, dia em que se lembra a importância das discussões sobre a conservação ambiental, uma preocupação de Niède.
Nessa data, em 1972, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, que ficou conhecida como Conferência de Estocolmo, teve início, marcando a primeira grande conferência sobre questões ambientais no mundo. Durante a tarde e a noite de quarta-feira (4), o corpo da arqueóloga foi velado em uma cerimônia aberta ao público. A cerimônia seguiu até a meia-noite, permitindo que moradores, iradores e colegas prestassem as últimas homenagens à pesquisadora que transformou a compreensão sobre a pré-história das Américas.
Niède: a mulher que, ao estudar a história, entrou para a História
Natural de Jaú (SP), Niède dedicou mais de 50 anos ao estudo da presença humana na região do semiárido piauiense, desafiando teorias estabelecidas e revelando ao mundo um Brasil milenar. Suas descobertas no Parque Nacional da Serra da Capivara, especialmente em sítios como o Boqueirão da Pedra Furada, apontaram a presença de humanos nas Américas há mais de 50 mil anos, muito antes do que a ciência aceitava até então.
A tese provocou intensos debates e ganhou projeção internacional, especialmente após a publicação de um artigo na revista Nature, em 1986, sugerindo a chegada do Homo sapiens ao continente há pelo menos 100 mil anos. Mais do que uma pesquisadora, Niède foi também uma incansável defensora da preservação do patrimônio cultural e natural.

Criou, em 1979, o Parque Nacional da Serra da Capivara, hoje Patrimônio Mundial da Humanidade reconhecido pela UNESCO, e fundou a Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM), onde atuou até os últimos anos como presidenta emérita. O falecimento de Niède ocorreu às vésperas do 45º aniversário do parque, celebrado no dia 5 de junho. A programação comemorativa incluía eios turísticos e ações com escolas públicas, atividades que refletiam o compromisso da arqueóloga com a educação e a valorização da história. Com o luto, parte da agenda foi suspensa.
Com a despedida de Niède Guidon, o Brasil perdeu uma de suas mais visionárias cientistas. Mas seu legado, gravado nas pedras da Capivara e nas páginas da arqueologia mundial, segue vivo.